"Cristão é meu nome e Católico é meu sobrenome. Um me designa, enquanto o outro me especifica.
Um me distingue, o outro me designa.
É por este sobrenome que nosso povo é distinguido dos que são chamados heréticos".
São Paciano de Barcelona, Carta a Sympronian, ano 375 D.C.

terça-feira, 4 de outubro de 2016

SÃO FRANCISCO DE ASSIS: Escritos polêmicos e curiosidades

Hoje a Igreja celebra o glorioso São Francisco, o poverello de Assis.


Há muitas biografias deste que é um dos maiores e mais venerados santos da história da Igreja, no entanto, no decorrer destes quase mil anos que nos separam da data de sua morte (ou melhor, de sua entrada na Glória Celeste) surgiram diversas modificações, omissões, acréscimos e distorções em sua história. Muitos se aproveitaram e continuam a se aproveitar da figura deste glorioso servo de Cristo para confirmar suas ideias, opiniões e ideologias.

Por conta disso, resolvi escrever este post, não apenas para enaltecer sua gloriosa pessoa como também para trazer à tona alguns aspectos não tão conhecidos de São Francisco.

Por uma feliz coincidência, há algumas semanas estou lendo o livro "Escritos e biografias de São Francisco de Assis, crônicas e outros testemunhos do primeiro século franciscano", da Editora Vozes. Nele estão compilados alguns escritos de autoria do próprio São Francisco, assim como biografias feitas por freis que com ele conviveram, além de outros escritos. Alguns trechos são verdadeiras pérolas, por este motivo faço questão de citá-los.

O título do post fala sobre "escritos polêmicos", não porque São Francisco teria escrito algo polêmico no sentido próprio (contrariando a Igreja ou algo do tipo) mas sim porque seus escritos - juntamente com o que dele escreveram seus fieis amigos biógrafos - contrariam a falsa imagem que dele pintam atualmente: um vagante cujas virtudes principais seriam o desapego dos bens materiais e o amor aos animais e às plantas, uma espécie de hippie ecologista cuja preocupação seria puramente material, alguém para quem pouco importaria a alma, a Fé e a Religião.

A POBREZA, A ORNAMENTAÇÃO DO TEMPLO E A LITURGIA

Começo pelo tema da ornamentação do templo, os paramentos usados para celebrar o Santo Sacrifício da Missa e os materiais usados para armazenar os Santos Mistérios (Cálice, patena, etc...).

Como se sabe, dentre os principais carismas que distinguiram São Francisco de Assis pode-se afirmar que o mais universalmente conhecido foi o seu amor e submissão à pobreza, a quem chamava irmã; Não por menos é chamado o poverello, isto é, aquele que nada dispõe de bens materiais, o "pobrezinho de Assis". Muitos clérigos e teólogos, dizendo seguir o exemplo, o ensinamento e o espírito de São Francisco, aplicam essa pobreza à ornamentação do templo, às vestes e paramentos e aos objetos sagrados usados na liturgia.

Eis o modelo de igreja e paramentos destes que defendem a pobreza inclusive na liturgia: despido de beleza e sacralidade

Mas, será mesmo que São Francisco defendia isso? Vejamos:

Consideremos todos nós clérigos o grande pecado e ignorância que alguns manifestam com relação ao santíssimo corpo e sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo e seu santíssimo nome (…). Logo, todos aqueles que administram tão sacrossantos mistérios (…) considerem no seu íntimo como são vulgares os cálices, corporais e panos de linho sobre os quais é oferecido em sacrifício o corpo e sangue de Nosso Senhor. (…) “Onde quer que o santíssimo corpo e sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo for conservado de modo inconveniente ou simplesmente deixado em alguma parte, que o tirem dali para colocá-lo e encerrá-lo num lugar ricamente adornado.
(Escritos de São Francisco, Carta a todos os Clérigos - 1238)

Ou então nessa outra:

Peço-vos ainda com mais insistência do que se pedisse por mim mesmo, supliqueis humildemente aos clérigos (…) que prestem a mais profunda reverência ao santíssimo corpo e sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo bem como a seus santos nomes e palavras escritos, que tornam presente o seu sagrado corpo. “Os cálices e corporais que usam, os ornamentos do altar, enfim tudo quanto se relaciona ao sacrifício, sejam de execução preciosa. “E se em alguma parte o corpo do Senhor estiver sendo conservado muito pobremente, reponham-no em lugar ricamente adornado e ali o guardem cuidadosamente encerrado segundo as determinações da Igreja, levem-no sempre com grande respeito e ministrem-no com muita discrição.”
(Escritos de São Francisco - Carta I – A todos os custódios - 1220)

Eis o modelo de igreja e paramentos segundo o que nos ensina São Francisco

Portanto, como podemos constatar nos Escritos de São Francisco, a pobreza  (que ele soube viver com perfeição) não se aplica à ornamentação da Igreja, aos paramentos e objetos litúrgicos. Isso por um simples motivo: a Igreja e a Santa Missa não são para nós mesmos, não são destinadas ao homem... São para Deus!

E para Deus, o melhor!

"PAZ E AMOR, BICHO". TERÁ SÃO FRANCISCO DEFENDIDO ESSA IDÉIA?

Outro ponto "polêmico" é que o São Francisco real não corresponde muito à postura "riponga" que hoje é atribuída a ele. Atualmente, muitos imaginam ter sido São Francisco um pacifista ecologista cujas pregações giravam em torno do "paz e amor" (ignorar qualquer tipo de conflito, conciliar tudo para evitar atritos) e do amor às plantas e animais... Quanto à alma? A verdade? O inferno? "Deixa isso pra lá, o que importa é o coração, vamos ignorar o que nos separa e valorizar o que nos une", diria São Francisco segundo alguns.

Não, São Francisco não pensava assim. Vejamos:

Todos aqueles e aquelas, porém, que não fazem penitência, não recebem o Corpo e o Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, vivem no vício e no pecado, no caminho da má concupiscência e dos maus desejos de sua carne, não observam o que prometeram ao Senhor, servem ao mundo com seu corpo cedendo aos desejos carnais, às solicitudes e aos cuidados deste mundo: escravos do demônio, de quem são filhos e cujas obras praticam... 
Onde, quando e como quer que um homem venha a morrer em pecado mortal, sem penitência e satisfação...
Desta forma, perdem tais homens o corpo e a alma neste breve século, indo para o inferno, onde serão atormentados por toda a eternidade".
(Escritos de São Francisco - Carta aos Fiéis - Capítulo II: dos que não fazem penitência)

Outras tantas citações há para continuar a demonstrar a preocupação de São Francisco em pregar o arrependimento e a penitência para a remissão dos pecados, a submissão à Lei de Deus e à Fé Católica, no entanto, creio ter sido suficiente.

Francisco, o incansável soldado de Cristo, percorria as cidades e povoados anunciando o Reino de Deus, proclamando a paz, pregando a salvação e a penitência para a remissão dos pecados...
(Escritos de São Francisco - Biografia escrita por Tomás de Celano,  companheiro de São Francisco aceito por ele na ordem por volta de 1215)

Percebe-se em São Francisco o amor, a preocupação e o zelo não apenas com a miséria material, a doença e a pobreza daqueles para quem dirigia sua pregação. Embora lhe importasse o corpo, mais ainda lhe importava a alma, a salvação eterna daqueles que o ouviam.

Ao contrário dos que pregam um falso ecumenismo, tão em moda em nossos dias, onde pouco ou nada importa a Verdade, onde Cristo e os ídolos são postos em pé de igualdade, onde a Verdadeira Religião divide espaço com as seitas, tudo em nome da "união" e da "paz", ao contrário destes era São Francisco, que foi até o Sultão Al-Malik Al-Kamil para falar-lhe de Cristo, conforme já publicamos aqui em nosso blog:

São Francisco de Assis diante do sultão al-Malik al-Kamil.
Fra Angelico ca. 1429, Lindenau Museum, Altenberg.

O sultão lhe apresentou outra questão:

− “Vosso Senhor ensina no Evangelho que vós não deveis retribuir mal com mal, e não deveis recusar o manto que quem vos quer tirar a túnica, etc. Então, vós, cristãos não deveríeis invadir as nossas terras, etc.”.

Respondeu o bem-aventurado Francisco:

− “Me parece que vós não tendes lido todo o Evangelho. Em outra parte, de fato, está dito: Se teu olho te escandaliza, arranca-o e joga-o longe de ti" (Mt. 5,25).

“Com isto quis nos ensinar que também no caso de um homem que fosse nosso amigo ou parente, que nos amássemos como a pupila do olho, nós devemos estar dispostos a separa-lo, e afastá-lo de nós, até arrancá-lo de nós, se tenta nos afastar da fé e do amor de nosso Deus".

“Exatamente por isto os cristãos agem de acordo com a Justiça quando invadem vossas terras e vos combatem, porque vós blasfemais contra o Nome de Cristo e vos empenhais em afastar de Sua religião todos os homens que podeis".

“Se, pelo contrário, vós quiserdes conhecer, confessar e adorar o Criador e Redentor do mundo eles vos amariam como a si próprios”.


Todos os presentes ficaram tomados de admiração pela resposta dele.
("Fonti Francescane", Seção terceira - Outros testemunhos franciscanos, número 2691).

Poderia escrever muitos outros exemplos "polêmicos" onde São Francisco contradiz a imagem frouxa e politicamente correta que dele fazem atualmente, no entanto, por ora creio ser suficiente.

Finalizo aqui implorando ao grande Pai São Francisco de Assis, grandiosíssimo discípulo de Nosso Senhor Jesus Cristo, para que ele - neste dia em que a Igreja o celebra - possa interceder por todos nós, pela Santa Igreja de Deus em seu momento de crise, confusão e incerteza, assim como por aquele que ocupa a Cátedra de Pedro e que leva seu nome.

VIVA SÃO FRANCISCO DE ASSIS!!

José Santiago Lima

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